Fui ativista estudantil (1967/68). Militante clandestino (1969/70). Preso político (1970/71). Tenho travado o bom combate, lutando por um Brasil mais justo, defendendo os direitos humanos, combatendo o autoritarismo.

Sou jornalista desde 1972. Crítico de música e de cinema. Cronista. Poeta. Escritor. Blogueiro.

Tentei e não consegui eleger-me vereador em São Paulo. Mas, orgulho-me de ter feito uma campanha fiel aos objetivos nortearam toda a minha vida adulta: a construção de uma sociedade igualitária e livre, tendo como prioridades máximas o bem comum e a felicidade dos seres humanos.

Em que a exploração do homem pelo homem seja substituída pela cooperação solidária do homem com os outros homens. Em que sejam finalmente concretizados os ideais mais generosos e nobres que a humanidade vem acalentando através dos tempos: justiça social e liberdade.

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segunda-feira, 18 de fevereiro de 2019

RETROCESSOS HISTÓRICOS NÃO DURAM MUITO; CIRCOS DE HORRORES PASSAM E A MARCHA PARA A CIVILIZAÇÃO PROSSEGUE

"O Brasil passa por seu pior retrocesso histórico desde 1964"
Uma velha tese marxista é a da alternância de fluxos e refluxos revolucionários.

O ascenso atinge um ponto máximo e, se a revolução não ocorre, sobrevém um período de pasmaceira e recuo, quando somos obrigados a nos manter em defensiva estratégica, acumulando forças para a onda seguinte.

Isto me parecia mais uma bela teoria do que algo real, até vê-lo acontecer no Brasil.

Houve um avanço impressionante, teórico e prático, ao longo de 1968, quando passamos a ter total clareza sobre o inimigo e sobre como tínhamos  de agir contra ele.

A correlação de forças, entretanto, nos era adversa demais. Não havia como vencermos.

Pior: fomos à luta com o que tínhamos de melhor, expondo quadros formados ao longo de décadas; e perdemos boa parte deles.

Então, disse-me um velho amigo sergipano, o que sobrou para reorganizar a esquerda foi a raspa do fundo do tacho.
Lamarca preferiu morrer como combatente

Eu não iria tão longe, mas era gritante a diferença qualitativa entre muitos dos companheiros tombados e parte dos que ascenderam depois do dilúvio.

Até porque alguns destes últimos eram os que haviam optado pela autopreservação naquele momento no qual os que tinham espírito de verdadeiros revolucionários não conseguiam ver-se a si mesmos fora da luta, por mais perigosa, até suicida, que ela se revelasse.

[ou alguém acredita que o comandante Carlos Lamarca, ao resistir aos insistentes apelos dos companheiros para que se pusesse a salvo no exterior, tenha perseverado por ainda acreditar na existência de chances de vitória naquele devastador ano de 1971?]

Até hoje a esquerda sofre com essas perdas. Até hoje não atingiu de novo os marcos então alcançados.

O que explica a posterior adesão a posições tão anacrônicas e desastrosas como:
— o apoio a ditadores sanguinários, na suposição de que seriam mal menor face ao imperialismo ianque (aos panfletários que utilizam tal expressão deve ter escapado o pequeno detalhe de que a guerra civil estadunidense terminou em 1865...), sem levar em conta que a desmoralização ao associarmos nossa imagem a tais abominações excede infinitamente os ganhos geopolíticos alegados – e não comprovados;
Francis já dizia: combate à corrupção é bandeira da direita
— o apoio a estados teocráticos, que faria Marx surtar se ainda estivesse vivo, pois o velho barbudo passou a vida inteira tentando alavancar a marcha da civilização para estágios mais avançados de desenvolvimento, nunca a volta a um passado obscurantista (e não há obscurantismo mais nefasto do que o fanatismo religioso!);
— o combate à corrupção, que, como Paulo Francis já dizia nos tempos d'O Pasquim, é bandeira da direita, pois desmoraliza a política e políticos como um todo, tornando o povo descrente da possibilidade de mudar seu destino, além de levar água para o moinho dos golpistas de direita;
— a bandeira do combate à privatização, como se empresas e órgãos públicos, sob o Estado atual, já não estivessem sob o controle indireto dos capitalistas, e como se fizesse grande diferença tal controle ser direto ou indireto; e
— a desistência de organizar o povo para uma transformação em profundidade da sociedade brasileira, preferindo apostar em pequenas melhoras sob o capitalismo, obtidas pela via eleitoral, sob estrita obediência aos valores republicanos.
    Cada vez que tocava num destes pontos, defendendo posições que no segundo semestre de 1968  já nem mais se discutiam de tão axiomáticas se haviam tornado, eu era alvo de algumas críticas civilizadas e de muitas desqualificações primárias por parte de cidadãos que perderam ou jamais adquiriram o hábito de discutir cordialmente com outros expoentes do seu campo, acabando por se mostrarem mais virulentos contra os ditos cujos do que contra o próprio inimigo.

    Recuos esporádicos não detêm a marcha da História
    Mesmo assim, nestes dias em que o Brasil passa por seu pior retrocesso civilizatório desde o golpe de 1964 (e no qual, por infeliz coincidência, eu vejo ruir mais uma vez meu castelo de cartas pessoal), só uma coisa é certa: perseverarei até o fim com minhas heresias, convicto de estar expressando os valores e posturas do ápice da última onda revolucionária, que serão o ponto de partida da próxima.

    As fases de refluxo podem até durar algumas décadas mas têm fim, pois a humanidade acaba sempre retomando sua caminhada para a frente.

    Então, como Marx e Engels vislumbraram ainda no século 19, a História não acabou nem acabará até que tenhamos chegado ao ponto final de nossa evolução: o 
    reino da liberdade, para além da necessidade, sem classes, sem estados, sem fronteiras, tendo a concretização do bem comum como prioridade máxima de nossas existências. (Celso Lungaretti)

    CHANCE DE ADQUIRIR O "NÁUFRAGO DA UTOPIA"
     DANDO UMA FORÇA PARA O AUTOR
    Quando me estava sendo difícil alugar algum cantinho para morar com as limitações financeiras atuais, um companheiro sugeriu que pusesse à venda exemplares autografados do Náufrago da Utopia (Geração Editorial, 2005, 304 p.). Agradeci a dica, mas respondi que me restavam só dois exemplares, o que inviabilizava a proposta.

    No entanto, no processo da mudança encontrei alguns mais no fundo do baú: ainda conservo uma dezena, dos que recebi da editora como último pagamento de direitos autorais.

    Hoje é um livro dificilmente encontrável em livrarias e, pelo menos por enquanto, não está prevista uma 2ª edição. Mas, claro, continua sendo fácil de achar nos sebos e o site da Estante Virtual oferece 61 opções neste exato instante. 

    Peço aos eventuais interessados que depositem R$ 70 na seguinte conta corrente da Caixa Econômica Federal: agência 2139 — tipo 001 — c/c 00020035-2 —  em nome de Celso Lungaretti (CPF 755982728-49)

    E me comuniquem pelos e-mails lungaretti@gmail.com lungaretti@uol.com.br (é melhor mandarem para ambos, assim um, pelo menos, chegará...), especificando qual será o nome para a dedicatória e o endereço para a remessa.

    E do que trata o livro, afinal? Para os que não conhecem, é a história, rigorosamente real mas contada com as ferramentas da ficção (como uma novela cuja ação transcorre no presente e não como uma abordagem teórica de um passado distante), da trajetória de um grupo de oito jovens estudantes que: 
    • constituiu-se a partir de 1967;
    • ergueu o movimento secundarista na zona leste paulistana ao longo de 1968;
    • ingressou da noite para o dia na Vanguarda Popular Revolucionária após a assinatura do AI-5; e
    • sofreu as consequências de sua opção precoce: dois assassinados, cinco presos e muito torturados, uma que passou incólume mas ficou paranoica.
    E, depois, quando nossos destinos nos conduziram em direções diferentes, minha descida pessoal ao inferno, as dificuldades em que me debati até escapar de uma armadilha da História e como isto só acabaria ocorrendo no presente século, mais de três décadas depois. (Celso Lungaretti)

    terça-feira, 20 de janeiro de 2015

    SER OU NÃO SER CHARLIE? SER OU NÃO SER CIVILIZADO?

    "...assim, mal dividido,
    esse mundo anda errado:
    que a Terra é do homem,
    não é de Deus nem do diabo"
    (Sérgio Ricardo, sertão vai virar mar)

    Apollo Natali, meu amigo há décadas e ex-colega de redação na Agência Estado, é um dos grandes jornalistas e dos melhores seres humanos que conheço. Sua opinião terá sempre lugar e vai ser sempre respeitada nos meus espaços virtuais, daí eu ter imediatamente concordado com o pedido de publicação do artigo Não sou Charlie (acesse aqui), expressando seu descontentamento, como religioso, com filmes e publicações que lhe parecem inconvenientes.

    Também tenho, claro, algumas palavras a dizer. Não se nega aos crentes o direito de sentirem-se ofendidos, mas vale lembrar que nenhum deles é obrigado a ler o Charlie Hebdo ou ver A última tentação de Cristo. Os que o fizeram, provavelmente, foi em função do falatório e das polêmicas, para verificarem se era ou não verdade o que se dizia a respeito de ambos --já predispostos, portanto, à indignação.

    No Ocidente, com a separação entre Igreja e estado, sua única iniciativa possível contra a fita era recorrerem aos tribunais. Felizmente, países contemporâneos à própria época não censuram filmes por atentarem contra a imagem de personagens históricos que alguns consideram sagrados, outros não. E já vão longe os tempos em que católicos queimavam bruxas e lançavam cruzadas sanguinárias contra os infiéis, então nenhuma besta-fera foi encher de balas o diretor Martin Scorcese ou o ator Willem Dafoe (que interpretou Cristo)

    Os responsáveis pelo semanário, por sua vez, jamais fizeram o que seria, realmente, uma provocação: providenciar traduções e lançar edições direcionadas para países e contingentes humanos que vivem no século 21, mas continuam com a cabeça no século 6.  

    A quais maometanos antes incomodavam, de verdade, os 60 mil exemplares do Charlie Hebdo comercializados semanalmente na Europa? Pouquíssimos, decerto. O que houve não foi nenhuma reação furibunda de indivíduos emocionalmente primitivos que estariam sentindo-se agredidos em sua fé, mas sim uma sanguinária e calculista demonstração de força de terroristas clássicos (aqueles que, como francos-atiradores dissociados das massas e sem estarem contribuindo para nenhum ascenso revolucionário, utilizam a violência apenas para punirem e intimidarem seus inimigos), os quais garimparam diligentemente, até encontrarem, um alvo condizente com a mensagem que queriam passar.

    Terroristas clássicos obtêm muitos holofotes, mas sua pirotecnia quase sempre levanta a bola para o inimigo marcar pontos, além de eventualmente ter consequências catastróficas. No primeiro caso está, p. ex., a tentativa de matarem o czar Alexandre III em 1897, que redundou na execução do irmão do Lênin, Alexandre Ulianov, e de quatro de seus companheiros, além, é claro, de um previsível agravamento da repressão política.

    E no segundo, tanto o assassinato do arquiduque Francisco Ferdinando por parte do mão negra Gravilo Princip em 1914, que conduziu aos horrores da 1ª Guerra  Mundial; quanto o atentado ao WTC em 2011, responsável pela pior escalada global de estupro dos direitos humanos e perseguição a inocentes que os cidadãos de origem árabe já sofreram.

    Marxistas e anarquistas há muito descartaram e se dissociaram do terrorismo clássico. Nos últimos tempos, contudo, contingentes desnorteados de esquerda, trocando a coerência com seu amadurecimento político que já haviam atingido pela mais tacanha realpolotik, vêm cometendo uma dupla heresia (este termo retrô cai como uma luva no atual contexto...):
    • a de defenderem fundamentalistas religiosos que não querem, de maneira nenhuma, fazer a humanidade avançar para além do capitalismo, mas sim fazê-la retroceder para antes do capitalismo, ou seja, para as trevas medievais; e
    • a de defenderem terroristas clássicos e seus monumentais tiros pela culatra, tornando-se parceiros dessas derrotas e associando estupidamente sua imagem a carnificinas que qualquer cidadão isento repudia.
    Caem no vazio suas tentativas de relativização de um episódio que foi, isto sim, totalmente bestial e absolutamente condenável. Quando alguém é chacinado por dá-lá-aquela-palha, buscar justificativas para o crime soa hipócrita e aberrante. Uma das diferenças entre nós e os animais é que, ao contrário dos touros, não temos nenhuma compulsão irresistível de destruir um semelhante apenas porque veste vermelho.

    Reconheço e até admiro a boa fé de religiosos como o Apollo Natali, mas não perdoo os esquerdistas que abdicam do seu compromisso fundamental com a civilização, passando a raciocinar como simplórios torcedores de futebol ("Se é contra os EUA, a Europa e Israel, vale tudo, até gol de mão nos acréscimos, em posição de impedimento"...).

    Por último: religiosos de ocasião e por conveniência à parte, como fica a questão das pessoas devotas que, sinceramente, sentirem-se insultadas em sua fé?

    Ora, sendo nosso estado laico, homens tidos como santos são encarados, por quem não é religioso, como personagens históricos (ou fictícios) iguais a quaisquer outros. Não cabe nenhuma forma de censura ou perseguição dos poderes públicos a quem trata Cristo ou Maomé da mesma forma que, digamos, Vlad Dracul e Hitler (os quais, aliás, têm lá seus defensores, mas 99,9% do que aparece sobre eles em filmes e semanários é extremamente negativo).

    E, como a ninguém é dado o direito de fazer justiça com as próprias mãos no Brasil do século 21, só resta aos ofendidos o caminho dos tribunais e de iniciativas visando ao convencimento da opinião pública (desde anúncios pagos até campanhas virtuais incentivando o boicote aos blasfemos).

    No fundo, o que os religiosos pretendem é que se conceda um tratamento diferenciado para quem eles consideram diferente. Mas, agnósticos, ateus e mesmo religiosos de outras confissões podem discordar (um neopentecostal admitiria, p. ex., Oxalá como similar a Jesus Cristo?). Então, não faz nenhum sentido, em termos legais ou morais, pretender que a imprensa não os ridicularize como ridiculariza outros personagens históricos do passado e do presente.

    Podemos até achar que a irreverência é exagerada no seu todo, que a nossa imprensa pega pesado demais com Paulo Maluf e Jair Bolsonaro, ou que a francesa pega pesado demais com Jean-Marie Le Pen e Maomé. O que não podemos é aceitar como válidos os piores achincalhes a Bolsonaro, Maluf e Le Pen e, ao mesmo tempo, não admitir a mais inofensiva irreverência com Maomé.

    Caso contrário, para que terão servido, afinal, 1945 e 1985 aqui, o iluminismo e a grande revolução lá? E de que valeu tantos resistentes morrerem lutando contra os nazistóides daqui e contra os nazistas de lá? Pois eram todos expressões da intolerância, fanatismo e autoritarismo inseparáveis da tese da intocabilidade dos homens santos...

    Além do mau humor e dos maus bofes, claro!

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    sábado, 10 de janeiro de 2015

    QUEM NÃO É CHARLIE ESTÁ PERDENDO O TREM DA HISTÓRIA

    O martírio de Alexandre Ulianov  motivou...
    Ao nascerem, tanto o marxismo quanto o anarquismo prometiam conduzir a humanidade a um estágio superior de civilização.

    A proposta de ambos era a de um melhor aproveitamento do potencial produtivo existente, direcionando-o para a promoção da felicidade coletiva, ao invés de desperdiçá-lo em desigualdade e parasitismo.

    A hipótese anarquista nunca foi testada: não houve país em que cidadãos livres organizassem, por tempo suficiente para extrairmos conclusões, a economia e a sociedade sem a tutela do estado.

    A hipótese marxista não foi testada da forma como seus enunciadores previam: em países cujas forças produtivas estivessem plenamente desenvolvidas.

    Nas duas nações ditas socialistas que realmente contam, a revolução teve de cumprir uma etapa anterior, qual seja a de acumulação primitiva do capital, já que se tratava de países ainda desprovidos da infra-estrutura básica de uma economia moderna.

    Acabaram tendo de exigir esforços extremos dos trabalhadores; e, como eles não se dispunham livremente a isto, a URSS e a China, cedendo ao imperativo da sobrevivência, coagiram-nos a dar essa quota de sacrifício.

    Ou seja, tornaram-se tiranias. Uma mais brutal e genocida, a stalinista. A outra mais messiânica e fanática, a maoísta.
    ...o irmão Lênin (que não repetiu seus erros).

    Aos trancos e barrancos, cumpriram a função histórica de trazer países atrasados até o século XX. A partir daí, entretanto, passaram a emperrar as forças produtivas, ao invés de as deslanchar.

    socialismo real da União Soviética e satélites caiu de podre, com tais nações voltando ao capitalismo.

    O maoísmo tentou ainda resistir aos ventos de mudança com a revolução cultural, em vão. Depois de uma luta travada na cúpula, sobreveio o pior dos mundos possíveis, um amálgama de capitalismo de estado na economia com ditadura do partido único na política.

    De 1989 para cá não surgiu uma proposta revolucionária alternativa capaz de vingar nos países economicamente mais desenvolvidos -- aqueles que, segundo Marx, desbravam os caminhos que depois são seguidos por todos os outros.

    Inexiste hoje uma estratégia que contemple a concretização simultânea das três bandeiras principais do marxismo e do anarquismo: a promoção da justiça social, o estabelecimento da liberdade plena e o incremento da civilização.

    Unir essas três pontas soltas, na teoria e na prática, é nossa principal tarefa no século XXI.

    FLERTANDO COM O RETROCESSO

    Até lá, devemos esforçar-nos para, pelo menos, não nos tornarmos agentes da tirania e da barbárie.

    O capitalismo globalizado é tão decadente, putrefato e destrutivo quanto a escravidão nos estertores do Império Romano. Já não oferece valor positivo nenhum à sociedade, só os negativos.

    É mais um motivo para não nos comportarmos como a imagem invertida de nossos inimigos.
    Revolucionários não podem condescender com a barbárie

    Se a indústria cultural deles se tornou totalmente parcial e tendenciosa, não é justificativa para substituirmos a reflexão pela propaganda em nossos meios de comunicação, endeusando líderes, exagerando acertos e minimizando/escondendo erros.

    A imprensa burguesa se desacredita e desmoraliza a olhos vistos. Temos de ocupar esse espaço vazio, mostrando-nos capazes de cumprir melhor as três funções do jornalismo: informar, formar e opinar.

    E não deixarmos que a função opinativa impregne tudo e determine o conteúdo das outras duas. Se eles não dispõem mais de credibilidade, só teremos a ganhar zelando escrupulosamente pela nossa.

    E não é qualquer forma de luta que nos serve, como serve para eles.

    P. ex., devemos repudiar firmemente o verdadeiro terrorismo --não confundir com o embaralhamento manipulatório de conceitos por parte da imprensa burguesa, que tenta desqualificar como terroristas as ações de legítimo exercício do direito de resistência a tiranias (caso das guerrilhas latino-americanas da segunda metade do século passado).

    Existimos para despertar nos explorados a consciência de sua condição real sob o capitalismo, a fim de que eles comecem a buscar a libertação. Não para aterrorizar a classe dominante com bombas e balas que, desde os tempos do irmão do Lênin (*), jamais a impediram de continuar dominando.
    O preço desta travessura foi pago em fascistização. Saiu caro.  

    Tais demonstrações de força, quando não são promovidas durante ascensos revolucionários (carecendo, portanto, do apoio ou simpatia da sociedade), levam água para o moinho dos fascistas, facilitando-lhes a disseminação do autoritarismo. Foi o que sucedeu depois do atentado ao WTC e é o que ocorrerá a partir da matança no Charlie Hebdo.

    O pior é que a recaída no terrorismo clássico, hoje descartado como contraproducente tanto por marxistas quanto por anarquistas, provém de agrupamentos que nada --ABSOLUTAMENTE NADA!!!-- têm a ver com o ideário e as tradições da esquerda: os fundamentalistas religiosos.

    Do ponto de vista de quem quer fazer a História avançar PARA ALÉM DO CAPITALISMO, é de uma incongruência extrema qualquer identificação ou condescendência para com fanáticos asnáticos que lutam contra o progresso e a modernidade, tentando fazer com que a História retroceda PARA ANTES DO CAPITALISMO

    Acumpliciarmo-nos com a pobreza espiritual, o atraso e a intolerância medievais só nos traz descrédito, fazendo com que deixemos de ser vistos como uma alternativa consequente à dominação burguesa.

    Que cidadão bem informado e dotado de espírito crítico levará a sério os apologistas de Bin Laden, Saddam Hussein, Muammar  Gaddafi, etc.? Vislumbrar insuspeitadas virtudes em tiranetes, torturadores e assassinos é a receita certa para o isolamento. E, se não conseguirmos transcender os limites de uma seita, jamais transformaremos em profundidade a sociedade brasileira. É simples assim.
    Esta é a luta na qual temos um papel a desempenhar

    Então, não podemos encarar a política com o mesmo simplismo passional das torcidas organizadas de futebol. Se continuarmos desculpando e justificando todas as vilanias cometidas por vilões que confrontem ou pareçam confrontar os EUA, Israel e que tais, acabaremos reduzidos à insignificância e à impotência, justamente nestas décadas cruciais em que se decidirá se a marcha da insensatez vai ser detida... ou não.

    A opção entre civilização e barbárie hoje assume feição dramática para nós.

    Pensadores como Norman O. Brown avaliam o capitalismo, em última análise, como um instrumento cego de destruição da humanidade. Isto se torna bem plausível se considerarmos, p. ex., as alterações climáticas e a dilapidação de recursos naturais essenciais à nossa sobrevivência.

    Para nós, os empenhados na construção de um mundo melhor, o grande desafio é evitarmos que o enterro do capitalismo seja também o da espécie humana. E só cumpriremos tal papel se tivermos plena consciência do nosso compromisso fundamental com a civilização.

    Cabe-nos não apenas preservá-la e aprimorá-la incessantemente, como colocar suas conquistas ao alcance de todos, dando-lhes condições de desenvolverem plenamente suas potencialidades humanas.

    Como diria Marx, temos de dar o melhor de nossos esforços para que a humanidade saia de sua pré-história. Se depender dos fundamentalistas religiosos, isto jamais acontecerá.

    * Alexandre Ulianov, integrante de um grupúsculo de extrema esquerda que tentou assassinar o czar Alexandre III. Foi executado em 1897, aos 21 anos.

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