O jornalista Paulo Francis estava certíssimo ao qualificar a sociedade de consumo de inferno pamonha, ou bocó. Acertou na mosca.
Até a segunda metade do século passado, as criticadas elites procuravam, pelo menos, tornar o cidadão comum melhor do que era. Podia-se, claro, discordar do tipo de melhora que tinham em mente, mas não do conceito de que nossa jornada na Terra deva ser evolutiva. Não nascemos prontos, construímo-nos ao longo da vida.
A sociedade de consumo modificou para pior, bem pior, tal equação.
Os homens deixaram de ser tratados como cidadãos. Passaram a ser encarados, isto sim, como consumidores. Não são mais gente, são mercado.
Então, não se questionam mais seus desejos. Se alguém estiver querendo comprar, haverá alguém disposto a vender. Literalmente tudo, seja às escâncaras ou por baixo do pano.
Em termos psicológicos, isto significa, simplesmente, que as pessoas são mantidas numa eterna infância. Não superam mais o narcisismo inicial. Não encontram mais a justa medida entre o que querem e o que podem. Não aprendem que sua felicidade depende da felicidade dos outros, que sua satisfação e seu prazer serão muito mais completos se compartilhados.
Ao mesmo tempo, os objetos de consumo pelos quais tanto anseiam nunca são plenamente satisfatórios. E as vítimas da engrenagem infernal do sistema passam a vida inteira correndo atrás do que jamais obtêm, adquirindo o que não precisam e trabalhando sofregamente sem que haja justificativa real para tanto estresse e tanto enfarte.
Este é o motivo maior do declínio da esquerda nas últimas décadas. O que oferecíamos era uma perspectiva de sociedade melhor, na qual as pessoas se tornariam melhores: era o ideal do homem novo.
Os consumistas passam a vida apaixonados pelo próprio umbigo e querendo ter o mundo como espelho, pois anseiam pateticamente por verem-se nele refletidos. Não o pretendem melhorar, o que gostariam é de melhorar a própria posição numa sociedade desumana e injusta. Vai daí que hoje são bem poucos os que se dispõem a dedicar a vida aos grandes ideais.
Há meio século a Escola de Frankfurt previu que chegaríamos exatamente a este inferno pamonha, no qual os indivíduos perderiam o controle sobre suas próprias vidas, sem nem mesmo atinarem com os motivos de sua infelicidade, mesmerizadas pela influência atordoante da indústria cultural.
O que fazer? --indagaria Lênin.
Herbert Marcuse apostava que tal manipulação cientificamente implementada seria capaz de evitar que a maioria formasse uma consciência crítica, mas não que acontecessem, em determinadas circuntâncias, explosões espontâneas de revolta. Não dá para represar-se tudo. E as contradições insolúveis do capitalismo estão aí para fornecerem os estopins de tais explosões espontâneas; caso da crise econômica global.
Como nós, da esquerda, devemos nos comportar nos intervalos entre tais explosões espontâneas, nas marés vazantes, quando as massas não estiverem dispostas a nos acompanharem em voos mais altos?
É uma questão crucial.
Podemos manter a coerência com nossos ideais e, mesmo não influindo decisivamente nos acontecimentos políticos, continuarmos contestando as injustiças sociais, as formas mais sofisticadas de exploração do homem pelo homem que hoje predominam, a desumanização que o capitalismo promove e barbárie à qual nos conduz. Assim, estaremos nos qualificando para liderar contingentes mais amplos quando estes acordarem do coma induzido pelo sistema.
Há os que preferem combater o monstro com as armas do monstro, acreditando que não se tornarão monstruosos. No entanto, acabam é igualando-se ao que combatem. Não mudam o mundo; são mudados pelo mundo.
Até a segunda metade do século passado, as criticadas elites procuravam, pelo menos, tornar o cidadão comum melhor do que era. Podia-se, claro, discordar do tipo de melhora que tinham em mente, mas não do conceito de que nossa jornada na Terra deva ser evolutiva. Não nascemos prontos, construímo-nos ao longo da vida.
A sociedade de consumo modificou para pior, bem pior, tal equação.
Os homens deixaram de ser tratados como cidadãos. Passaram a ser encarados, isto sim, como consumidores. Não são mais gente, são mercado.
Então, não se questionam mais seus desejos. Se alguém estiver querendo comprar, haverá alguém disposto a vender. Literalmente tudo, seja às escâncaras ou por baixo do pano.
Em termos psicológicos, isto significa, simplesmente, que as pessoas são mantidas numa eterna infância. Não superam mais o narcisismo inicial. Não encontram mais a justa medida entre o que querem e o que podem. Não aprendem que sua felicidade depende da felicidade dos outros, que sua satisfação e seu prazer serão muito mais completos se compartilhados.
Ao mesmo tempo, os objetos de consumo pelos quais tanto anseiam nunca são plenamente satisfatórios. E as vítimas da engrenagem infernal do sistema passam a vida inteira correndo atrás do que jamais obtêm, adquirindo o que não precisam e trabalhando sofregamente sem que haja justificativa real para tanto estresse e tanto enfarte.
Este é o motivo maior do declínio da esquerda nas últimas décadas. O que oferecíamos era uma perspectiva de sociedade melhor, na qual as pessoas se tornariam melhores: era o ideal do homem novo.
Os consumistas passam a vida apaixonados pelo próprio umbigo e querendo ter o mundo como espelho, pois anseiam pateticamente por verem-se nele refletidos. Não o pretendem melhorar, o que gostariam é de melhorar a própria posição numa sociedade desumana e injusta. Vai daí que hoje são bem poucos os que se dispõem a dedicar a vida aos grandes ideais.
Há meio século a Escola de Frankfurt previu que chegaríamos exatamente a este inferno pamonha, no qual os indivíduos perderiam o controle sobre suas próprias vidas, sem nem mesmo atinarem com os motivos de sua infelicidade, mesmerizadas pela influência atordoante da indústria cultural.
O que fazer? --indagaria Lênin.
Herbert Marcuse apostava que tal manipulação cientificamente implementada seria capaz de evitar que a maioria formasse uma consciência crítica, mas não que acontecessem, em determinadas circuntâncias, explosões espontâneas de revolta. Não dá para represar-se tudo. E as contradições insolúveis do capitalismo estão aí para fornecerem os estopins de tais explosões espontâneas; caso da crise econômica global.
Como nós, da esquerda, devemos nos comportar nos intervalos entre tais explosões espontâneas, nas marés vazantes, quando as massas não estiverem dispostas a nos acompanharem em voos mais altos?
É uma questão crucial.
Podemos manter a coerência com nossos ideais e, mesmo não influindo decisivamente nos acontecimentos políticos, continuarmos contestando as injustiças sociais, as formas mais sofisticadas de exploração do homem pelo homem que hoje predominam, a desumanização que o capitalismo promove e barbárie à qual nos conduz. Assim, estaremos nos qualificando para liderar contingentes mais amplos quando estes acordarem do coma induzido pelo sistema.
Há os que preferem combater o monstro com as armas do monstro, acreditando que não se tornarão monstruosos. No entanto, acabam é igualando-se ao que combatem. Não mudam o mundo; são mudados pelo mundo.
CANDIDATURAS IDEOLÓGICAS x CANDIDATURAS DE CONSUMO
Se o que os eleitores queriam era um monstro... |
Na eleição paulistana, o produto assim determinado como o de maior aceitação potencial no mercado seria um candidato ao mesmo tempo novo e conservador.
Isto explica o empenho do Lula em impor o Fernando Haddad, que nem de longe tem a cara do PT, mas se encaixa na imagem do novo.
O PMDB também apostou numa figura de galã de telenovela, Gabriel Chalita.
O PSDB pensou que desse para maquilar o (hoje) conservador José Serra, fazendo-o parecer bem mais novo do que é. Botou-o para pedalar, para subir em skates, para bater pênaltis, etc., mas a mágica besta não funcionou: ele quase caiu do skate, isolou o sapato e mergulhou o ridículo, tornando-se o alívio cômico da campanha na internet.
Como já tinha a preferência de cabresto dos evangélicos zumbificados e dos videotas acostumados a vê-lo posar de paladino dos consumidores, o novo conservador para o qual o eleitorado está pendendo é Celso Russomanno.
Pior: com parcela substancial de votos tradicionalmente petistas.
Então, é hora de o PT fazer uma profunda reflexão sobre se compensou abandonar as candidaturas ideológicas e aderir às candidaturas de consumo.
...encontraram: esta imagem atesta o acerto da escolha. |
Agora, o candidato petista é propagandeado da mesmíssima forma e faz as mesmíssimas promessas mirabolantes dos centristas, direitistas e dos meros fisiológicos. Não tem mais sequer os cabos eleitorais voluntários, precisa contratar tarefeiros.
Então, quando a figura não convence, como o insosso Haddad, o atual eleitorado petista migra insensivelmente para um antípoda ideológico como o Russomanno.
E, se um dia houver crise grave, nestes tristes trópicos em que o golpismo nunca se torna prática definitivamente sepultada, jamais lutará pelo governante que escolheu.
O grande Plínio de Arruda Sampaio certa vez colocou o dedo na ferida: valeu a pena o PT ter chegado à Presidência com o compromisso de manter intocada a política econômica neoliberal, ou seja, limitado a gerenciar os negócios capitalistas como um FHC o faria?
Da mesma forma, não seria melhor, vencendo ou perdendo a eleição, educar o eleitorado, tentando convencê-lo de que precisa, isto sim, de um contestador, pouco importando se novo ou velho? Pois, prostrando-nos desta forma aos humores momentâneos das massas, o que faremos quando a maré for fascista? Escolheremos um candidato que seja clone do Mussolini?!
Há dois milênios, Jesus Cristo já dizia que não: "O que aproveita ao homem ganhar o mundo inteiro, se perder a sua alma?" (Mateus, 26:16).
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